Seguindo à risca tanto a lei de Murphy quanto o efeito borboleta, duas besteiras que inventamos para tentar explicar o inexplicável - o destino -, eu ontem terminei o dia diante da tv, refastelado no sofá da sala, telespectador de um dos meus mais improváveis interesses: O UFC.
Logo quem, logo eu, olha só... que sempre desprezei "competições" do gênero, apesar de já ter sido um assíduo observador de boxe numa época mais remota, de nomes mais nobres como o próprio esporte, tais como Sugar Ray Leonard, Roberto Mano de Piedra Duran, Evander Holyfield, Tyson. Época em que as mais importantes lutas do mundo podiam ser vistas na tv aberta.
Com o tempo, vieram a tv a cabo e os torneios de lutas marciais, enquanto o boxe perdia espaço. E eu, que sempre achei no mínimo estranho o interesse por dois caras se batendo, se agarrando, se roçando sem parar em meio a um banho de sangue, simplesmente parei de assistir a qualquer tipo de luta na tv.
Mas ontem fui pego por um interesse histórico que não poderia simplesmente ignorar. Cedo, por volta das onze da noite, zapeando a tv, passo pelo Sportv e fico sabendo que a grande atração do UFC 102, que já estava sendo transmitido ao vivo, seria o combate entre o brasileiro Rodrigo Minotauro e o americano Randy Couture, duas lendas desse esporte, se é que se trata realmente disto, esporte.
Nunca parei para ver, mas sei bem o que ambos representam para o MMA.
O famoso octagon estava montado bem no meio da quadra do Rose Garden, casa do Portland Trail Blazers. Uma turba formada basicamente de jovens enlouquecia a cada apresentação dos lutadores - antes do combate principal, foram outros tantos preliminares. Assisti ao primeiro, chatíssimo, em que o vencedor foi anunciado debaixo de vaias - as mesmas que pontuaram toda a luta, composta por três rounds de cinco minutos. Vaiavam a falta de iniciativa dos lutadores. Isso porque não viram os quinze segundos finais do segundo assalto. Num capricho do tal destino citado lá em cima, uma sequência de clinch com os dois brutamontes de pé, entrelaçados pelos braços, foi captada pela câmera certa, no ângulo perfeito, no momento ideal. Resultado - uma cena que faria corar qualquer defensor do movimento arco-íris por conta de sua sugestão sexualmente gay. Muito gay.
Depois desta, vi outra, em que um brasileiro com onze lutas de invencibilidade no cartel foi nocauteado no primeiro soco, um direto no queixo que parecia saído de desenho animado, daqueles em que a cabeça fica e o corpo segue adiante. Caiu grogue, derrotado, envergonhado. Minha paciência para esses aperitivos acabou e marquei o tempo que deveria faltar até o prato principal.
Quatro partidas de Winning Eleven depois, lá estava eu de volta ao sofá, alertado pelo anúncio exagerado da entrada dos lutadores.
Minotauro, 33 anos, e Couture, 46, subiram ao octagon carregando não cinturões, mas uma história de glórias na competição mais famosa do MMA. Ambos na mais absoluta forma, secos e musculosos, compenetratos. Couture, claro, tinha da platéia o mesmo carinho que Rocky Balboa em seus filmes. O Brasileiro, apesar de também idolatrado por lá, desta vez atuava no papel de vilão.
Foram quinze minutos que apreciei da mesma forma que uma boa luta de boxe. Aliás, boxe foi o que se mais viu nesse tempo, com os dois lutadores trocando socos sem nenhuma prudência em várias oportunidades. "Trocação" franca, diziam na tv. Corro pro dicionário. A palavra não existe, como eu imaginei. Tudo bem, o comentarista, também tenho certeza de que foi inventado.
Numa dessas trocas de socos, Minotauro leva Couture ao chão. Tenta a montada e a finalização mas, para surpresa geral, o americano sai do triângulo que o brasileiro tentou a todo custo e força aplicar. Surpreendente, para dizer o mínimo.
A situação se repetiria. Um direto de Minotauro, Couture novamente no chão. Desta vez, o brasileiro imprensa o americano na grade e, de novo, tenta o estrangulamento. Fica longos minutos sobre ele quando, numa troca de posição, passa a ficar ainda mais à vontade para castigá-lo, soco atrás de soco, sempre na cabeça. Nada do juiz, também brasileiro, parar a luta. Nada do americano apagar. Mais uma vez, me surpreendo com sua resistência. O que não me surpreende, de forma alguma, é o impacto das cenas, de uma violência assustadora, daquelas em que, numa situação normal, você pensa “porra, assim ele vai matar o cara”.
Nada. Os dois se levantam, a luta acaba. Minotauro é declarado vencedor. Comemora sob tímidas vaias, já que foi claramente superior. Ouço a palavra “trocação” pela enésima vez. Tento ser menos intolerante e pensar que se trata de um termo próprio do esporte. “Impróprio é o catso, se são jornalistas, devem falar nossa língua com correção”.
É, realmente tem certas coisas as quais eu não consigo me acostumar.
4 comentários:
porra, perdi! tava na casa de umas amifgas, comentei tua mensagem e o marido de uma delas comenta baixo, quase em tom de constrangimento: "adoro"!
vale tudo é foda rapá!
Faltou dizer sobre a "raspada" do Minotauro no segundo round. Sensacional! Que técnica, amigo!
Tu já tá fazendo muita "trocação", Virgil?... ah, esqueci que é jiu-jitsu, é só a sarração, quer dizer, "raspada", hehehe.
A luta do Minotauro com o Couture foi sim boa de ser ver, dois guerreiros.
Os outros todos não eram, só eles dois pareciam estar ali em cima sem nenhuma cautela, prontos pra tudo. Duca mesmo. Mas os próximos 102 eu passo.
Você é uma figura, camarada! A academia está aberta, viu? Se quiser é só chegar. A aula de boxe é muito boa também. Tem muita "trocação". Hahaha!
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