quinta-feira, 12 de julho de 2012

Extra! Extra! (Quer dizer...)

Acho que a molecada de hoje só associa o termo ao jornal criado para nos dar a impressão de que a cidade tem mais de um veículo diário impresso (pouca coisa poderia ter sido pior que o fim do JB para o jornalismo no Rio de Janeiro). Mas, antigamente, "extra!" era o bordão usado para anunciar nas ruas uma edição extra (ora bolas) de qualquer periódico, como os conhecíamos antigamente. Ou, pelo menos, alguma notícia bombástica de primeira página. O que seria muito apropriado para esta:

Teixeira e Havelange receberam R$ 29,4 mi da ISL, mostra relatório - Documentos divulgados por Justiça Suíça mostram que ex-dirigentes ganharam comissões de extinta agência de marketing parceira da Fifa.

Como era de se esperar, já nem aparece mais entre os destaques do globoesporte.com.

Mas tem o Juca.

Tem a Folha.

O UOL.

E, claro, a Record, mesmo como parte interessada no imbróglio.

Tudo como antecipamos aqui, em março, quando Ricardo Teixeira saiu correndo da CBF, ao concluir que, inevitavelmente, a casa cairia.

Caiu.

Mas caiu num país em que o Maluf anda solto na rua, o Collor ainda está na política e a trinca Nuzman/Cabral/Paes faz miséria por conta de 2016.

quinta-feira, 22 de março de 2012

O Maior Do Mundo Nunca Mais.

Este será um post curto e grosso, porque o assunto, só de pensar, só de lembrar, já me levou às lágrimas mais de uma vez. E, como vou ao Engenhão semana sim, semana também, confesso que trata-se de algo que povoa minha mente com frequência bem maior que gostaria.

Que o Maracanã, como nós o conhecíamos e amávamos, acabou, todo mundo sabe. Aquele gigante, que na final da Copa de 50 abrigou 199.854 torcedores, não existe mais há tempos. Sucessivas reformas e maquiagens já faziam dele, antes das obras para o Mundial de 2014, uma sombra do que um dia fora - mas, pelo menos, sabíamos que ainda era o bom e velho Maraca, só que com um lifting.

Depois de fechado para obras, foram surgindo, aos poucos, notícias cada vez piores. Primeiro, a de que a nova capacidade ficaria em torno de 76 mil lugares, o que o torna apenas o vigésimo-quinto do mundo em tamanho. Eu assisti a um Brasil x Paraguai, pelas eliminatórias da Copa de 86, junto a outras 139.922 pessoas.

Em seguida, a diminuição do tamanho do gramado, determinada pela FIFA - dos 110 x 75 metros de outrora para 105 x 68 metros, mesmas medidas do Engenhão (só para efeitos de comparação, o campo da Vila Belmiro tem 106 x 70 metros - o olho já se enche de lágrimas).

Agora o escritório Fernandes Arquitetos e Associados divulga imagens mais esclarecedoras de como será o estádio por dentro. Lembram-se do que foi alardeado? Que as arquibas seriam únicas, de cima a baixo, até o gramado? Pois não será bem assim.



A imagem acima mostra um trecho onde a arquibancada, já na sua porção superior, será dividida em duas - duas bem pequenas partes, como mostram as setas toscamente feitas por mim, no Gimp. Logo abaixo, um espaço enorme que deve compreender os 108 camarotes do projeto (cliquem na foto para ampliá-la - o Blogger está cada vez melhor).



Esta foto das obras, recente, mostra como apenas um dos lados terá esta divisão - o outro, também destacado, sugere que, atrás dos gols, a arquibancada será um espaço único, sem divisão. Como também deve ser do lado oposto às cabines de transmissão e camarotes, como mostra a outra imagem divulgada ontem, esta aqui embaixo.



Notem como, pelas imagens, o estádio perderá qualquer semelhança com o que um dia foi - um gigante belo e imponente, acolhedor e espaçoso para multidões que ali tinham momentos da mais pura paixão pelo futebol, fosse num clássico lotado, fosse num Flamengo x Blumenau, pela Copa do Brasil de 1989, onde apenas 3.567 pessoas, além de mim, viram Bujica marcar duas vezes, num time que tinha acabado de perder Bebeto para o Vasco, em que Zico vestia a camisa dez. Cheio ou vazio, o Maraca era uma casa para mim.

Hoje, 23 anos depois, sou um sem-teto.

* * *

Só para lembrar, o custo das obras - de reforma, vale sempre lembrar - tocadas pelo consórcio Andrade Gutierrez, Odebrecht e Delta, no momento, está 883,5 milhões de reais. A Allianz Arena, em Munique, palco da abertura da Copa de 2006, custou 850 milhões, da pedra fundamental ao resultado final divino.

terça-feira, 13 de março de 2012

Correu.


Há muito eu não via uma mesma notícia ser dada e analisada de tantas formas diferentes quanto essa fuga-renúncia de Ricardo Teixeira. Considerados o personagem e sua história nada honrosa, chega a ser nojenta a maneira como indivíduos e corporações têm se posicionado desde ontem.

Vale e muito ressaltar que, mesmo em seu derradeiro ato como presidente da CBF, Ricardo Teixeira manteve-se fiel ao que sempre foi - um homem escuso. Há duas semanas, quando sua saída já era dada como certa, nenhuma palavra sobre o assunto foi dita na Assembleia Geral Extraordinária da entidade, quando presidentes das federações vieram ao Rio apenas para ouvir que Teixeira entraria de licença médica. Ontem, esses presidentes souberam da mentira da mesma maneira que eu e você - através da leitura da carta de renúncia por José Maria Marin, que também ocupará o posto deixado vago no Comitê Organizador Local da Copa.

"Fiz, nestes anos, o que estava ao meu alcance, sacrificando a saúde, renunciando ao insubstituível convívio familiar. Fui criticado nas derrotas e subvalorizado nas vitórias. Mas isso é muito pouco, pois tive a honra de administrar não somente a Confederação de Futebol mais vencedora do mundo, mas também o que o ser humano tem de mais humano: seus sonhos, seu orgulho, seu sentimento de pertencer a uma grande torcida, que se confunde com o país." - Ricardo Teixeira

É muita cara de pau.

Nada que surpreenda, claro, desde que a revista Piauí publicou a aclamada e determinante reportagem de Daniela Pinheiro em julho do ano passado. Ela acompanhou Teixeira durante um congresso da FIFA, em Zurique, na Suíça, quando o então presidente da CBF soltou a língua sobre diversos assuntos.

"Em 2014, posso fazer a maldade que for. A maldade mais elástica, mais impensável, mais maquiavélica. Não dar credencial, proibir acesso, mudar horário de jogo. E sabe o que vai acontecer? Nada. Sabe por quê? Porque eu saio em 2015. E aí, acabou."

Não à toa, essa frase fecha a reportagem de 8 páginas-tamanho-Piauí. Nela, Ricardo Teixeira atacou imprensa("É tudo coisa da mesma patota, UOL, Folha, Lance, ESPN, que fica repetindo as mesmas merdas."), defendeu a Rede Globo ("Só vou ficar preocupado quando sair no Jornal Nacional."), afirmou não ligar para as denúncias de corrupção ("Não ligo. Aliás, caguei. Caguei montão.") e jurou perseguição à BBC ("Enquanto eu estiver na CBF, na FIFA, onde for, eles não entram.")

É na BBC que trabalha Andrew Jennings, jornalista que fez a denúncia sobre o esquema de propina que teria rendido a nomes como Teixeira e João Havelange cerca de 100 milhões de dólares nos anos 90, através da extinta ISL. E é essa história, que tem uma bomba de nêutrons prestes a explodir, a real motivadora da renúncia de ontem. Segundo o jonalista suiço Jean François Tanda, trata-se apenas de uma questão de tempo até que a Justiça do país divulgue a documentação levantada durante a investigação do escândalo ISL. Tanda e Jennings são parte da ação. Quando essa documentação for divulgada, os jornalistas odiados por Teixeira em todo o planeta terão acesso. Surgirão então os nomes dos verdadeiros donos de empresas como a Sanud, que foi sócia da RLJ Participações, de Teixeira, no Rio de Janeiro. E outras, como Ovada, Wando, Sicuretta, Beleza. Juntas, teriam liberado quase 54 milhões de dólares em propina, entre 1989 e 1997. Todas elas, empresas de fachada - o irmão de Ricardo Teixeira, Guilherme, por exemplo, aparece como procurador da Sanud no Brasil.

Enquanto isso, como era de se esperar, os mais diferentes tratamentos são dados ao ex-presidente da CBF.

O Jornal Nacional de ontem o exaltou como um dos maiores responsáveis pelo sucesso da seleção brasileira, duas vezes campeã do mundo enquanto ele presidiu a CBF. Destacou os 112 títulos conquistados durante sua gestão, a padronização da forma de disputa do campeonato brasileiro - como se ele próprio não tivesse sido um dos maiores opositores ao sistema de pontos corridos, só adotado após 14 anos de mandato. Pra completar, cita que todos os processos contra ele foram arquivados pela Justiça.

(Aqui vale uma volta no tempo. Em 2001, no auge da CPI da Nike, a Globo botou no ar um Globo Repórter que, entre outras coisas, sustentava que a renda de Ricardo Teixeira era incompatível com seu patrimônio. Poucos dias depois, a CBF anuncinou a mudança de horário de um Brasil x Argentina - em vez do horário-padrão-depois-da-novela, o jogo passou para as 19h45. "Pegava duas novelas e o Jornal Nacional. Você sabe o que é isso?", disse Teixeira à jornalista Daniela Pinheiro em sua reportagem para a Piauí, quando o caso foi relembrado. A partir deste episódio, nunca mais a Globo contrariou o mandatário da CBF)

A Record, claro, caiu em cima ontem, como também era de se esperar. Nunca teve da CBF o mesmo tratamento dispensado à Globo nas negociações sobre direitos de transmissão. A entidade deu apoio à emissora do Rio em 2010, quando esta negociou diretamente com os clubes os direitos do campeonato brasileiro. Record e Rede TV - que chegou a vencer uma patética concorrência promovida pelo Clube dos 13 - ficaram a ver navios. Os dois primeiros clubes a acertar com a Globo? Corinthians e Flamengo, cujos presidentes têm estreitas relações com Ricardo Teixeira.

Mesmo O Globo, que questiona o porquê de sua saída após 23 anos de acusações justamente nesse momento, a dois anos da Copa, cita pressão familiar, saúde debilitada e até a exposição da filha mais nova, que teria ouvido comentários constrangedoras sobre o pai na escola. Sério?

No meio disso tudo, ainda há as opiniões pessoais de quem vive o futebol. Opiniões não menos discrepantes que as dos veículos de comunicação.

"Hoje podemos comemorar. Exterminamos um câncer do futebol brasileiro. Finalmente, Ricardo Teixeira renunciou à presidência da CBF." - Romário

"O ideal seria que ele não saísse. Mas, se a saúde o impediu de continuar na presidência da CBF, o importante é lembrar que em seu mandato a Seleção Brasileira conquistou duas Copas do Mundo e ainda o direito de sediar o Mundial de 2014." - Peter Siemsen, presidente do Fluminense

"Foram mais de 10 anos de impunidade e de cumplicidade de autoridades do Executivo, do Legislativo, do Judiciário e principalmente de dirigentes de federações" - Álvaro Dias, senador do PSDB-PR

Agora Ricardo Teixeira vai esperar, em Boca Raton, na Flórida, os próximos passos da justiça suíça.

Enquanto isso, por aqui, a Corregedoria da Justiça vai investigar o Tribunal Regional Federal da segunda região (TRF-2), que trancou a investigação por lavagem de dinheiro sobre Teixeira por habeas corpus. O despacho de trancamento da desembargadora Nizete Rodrigues Carmo, favorável ao habeas corpus pedido por Teixeira, diz que "não há provas novas que sustentem um processo” contra o dirigente e sua família." A inspeção dos corregedores federais vai de 18 a 28 de março.

Como se vê, o cerco se fecha, aqui e na Suíça. E é por isso, apenas por isso, que Ricardo Teixeira, depois de 23 anos de mandos, desmandos e enriquecimento, correu.

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Ei, mano.

Ontem eu perdi quase duas horas de minha vida assistindo à seleção brasileira de Mano Menezes, aquele que só foi chamado pela CBF porque o Muricy recusou o convite e, ainda assim, já está há mais tempo do que deveria no comando do escrete canarinho.

(como se vê, nem sempre eu uso o monte de tempo livre que tenho tido de forma inteligente)

Ontem, Mano Menezes perdeu mais uma chance de tentar dar cara ao seu trabalho e à nossa seleção, seja ela a olímpica ou a da próxima Copa do Mundo. Como nem ele nem eu e nem você fazemos ideia do time para Londres, vamos pensar apenas no que realmente interessa, que é o mundial de 2014.



Ser convidado para o cargo de técnico da seleção brasileira é mais ou menos como ser chamado para dirigir um filme podendo escolher roteiro e atores ao seu gosto (não virão metáforas oscarianas, pode ficar tranquilo). É algo bem diferente de assumir o comando de um clube, quando o técnico recebe um elenco já montado e, no máximo, vai ganhar um ou outro reforço que tiver pedido. Dependendo do clube, do elenco e do seu próprio prestígio, o técnico vai escolher como seu time jogará e quais jogadores vai utilizar. O elenco tem bons volantes, como o Corinthians de Tite? Arma-se um esquema específico. Tem abundância de jogadores do meio para frente, como o Flu de Abel? Arma-se outro esquema, que os valorize. E assim é. Assumir uma equipe - em qualquer área, seja futebol, cinema ou jornalismo - é identificar pontos fortes e fracos de seus comandados e saber utilizá-los da melhor forma possível, maximizando virtudes e minimizando deficiências.

Quando se é convidado para dirigir uma seleção - a seleção brasileira, não menos - a história é completamente diferente.

Não há alguém acima do técnico dizendo "quero que o time jogue assim". Como se sabe, Ricardo Teixeira adora dinheiro e poder, mas detesta futebol.

Também não há uma tradição que diga que a seleção deve jogar de determinada forma. Isso já até existiu, como lembrou Pepe Guardiola depois da final contra o Santos, mas não mais. Desde a Copa da Itália, em 90, o Brasil alternou times retranqueiros e sem suficiente talento com equipes talentosas e mal armadas a gosto do comandante (e, desde 90, tivemos Lazaroni, Parreira, Zagallo, Felipão e Dunga, todos retranqueiros).

Há apenas a consciência do técnico. Ou a falta dela.

Mano, quando assumiu, fez um discurso lindo de se ouvir, que entusiasmou a todos nós que amamamos o futebol. Falou sobre resgatar o espírito da seleção brasileira, de jogar sempre pra frente, sempre bonito. Falou o que todos queríamos ouvir depois daqueles tempos sombrios em que Dunga esteve no comando.

De lá para cá, pouco ou nada se viu deste discurso. Mano sequer armou um time. Convocou 81 jogadores. Ninguém sabe o time titular, tirando uma ou outra posição. Ninguém sabe exatamente a maneira de jogar da seleção. Sabe-se, apenas, que não tem sido belo ou eficiente o seu futebol.

E aí, Mano?

Tem o melhor futebol do mundo (ainda, sim, certamente, em talento e quantidade) à sua disposição, pode chamar quem bem entender e armar o time como bem quiser.

E não faz uso dessa benção, desse presente divido que caiu em seu colo?



Vamos por partes:

O Goleiro - Nosso mano chamou dez jogadores pra posição. Dez. Depois de umas férias pós-África do Sul, Júlio César reassumiu o posto de titular. Merecido? Talvez sim. Júlio ainda é um dos melhores do mundo na posição e está na idade que, para um goleiro, é o auge - 32 anos. Novo e experiente. Apesar das últimas falhas, aqui e na Inter. Jefferson, do Botafogo, é o melhor em atividade no Brasil. E Diego Alves, do Valência, o que tem jogado melhor lá fora. Fechemos com esses três, pois.

Laterais - Foram doze chamados por Mano. Daniel Alves e Marcelo, com atraso, parecem finalmente ter assumido a condição de "novos titulares" pós-2010. Eu não dispensaria a experiência de Maicon e Adriano (do Barça) para a reserva; dois jogadores que, se preciso, podem entrar no time e dar conta do recado, mesmo em 2014.

Zagueiros - Há muito não tínhamos uma safra tão boa. Thiago Silva, David Luiz e Dedé são os nomes óbvios. Todos jovens, talentosos e cheios de disposição. Eu teria o Lúcio como o quarto zagueiro, pela experiência que poderia passar aos demais.

Volantes - Treze foram convocados. Vamos assumir que precisemos de quatro para a Copa, num esquema com dois deles - Hernanes, Lucas Leiva, Elias e Ramires. Explico adiante.

Meias - Ganso, Oscar do Inter, Kaká e Lucas do São Paulo.

Atacantes - Neymar, Pato, Leandro Damião e Nilmar.

Temos então uma lista de 23 nomes. São os meus, diga-se, mas também são os do Mano, pois todos foram, em algum momento, convocados por ele.

Falta então o fundamental, muito mais importante que os nomes - O SISTEMA DE JOGO.

Ora, como eu já disse, não se trata de jogar de acordo com o material humano que se tem - este é quase ilimitado, em se tratando da seleção brasileira. Se trata, sim, de pensar esse material humano da maneira como se quer jogar. Coisa que Mano não fez, desde o início.

Quatro...

Jefferson, Dani Alves, Dedé, Thiago Silva e Marcelo...

Dois...

Hernanes e Ramires, Lucas Leiva e Hernanes, Elias e Hernanes, tanto faz - todos sabem o ofício de marcar e jogar bola.

Dois...

Ganso e mais um - pode ser Kaká, se voltar a ser o que era, pode ser o jovem Lucas, do São Paulo ou até o mais jovem ainda Oscar.

Dois...

Neymar e Pato.

Um 4-2-2-2, com uma defesa e tanto, com os três melhores do mundo em suas posições (Thiago Silva, Dani Alves e Marcelo); dois volantes que saem pro jogo e saber jogar; dois meias de criação e dois atacantes genuinamente brasileiros.

Com tanto talento, qualquer mano poderia fazer um time ofensivo, com muito toque (posse) de bola, criatividade, velocidade, drible e, sobretudo, vocação ofensiva.

Eu, se fosse o tal mano da vez, iria além - um só volante e três meias, sendo Hernanes um deles. Mas aí é querer demais.

Principalmente quando o mano da vez escala Sandro, Fernandinho e R10, deixando Ganso e Lucas no banco. E sem saber como organizar os caras em campo. Hernanes esteve perdido, R10 só trocou a faixa de campo onde tem se arrastado e os atacantes não tiveram com quem jogar.

Ah, se a gente tivesse a visão e a humildade de chamar um gringo pra tocar nosso time...

Pep?

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Fight The Power.

Esqueçam mais essa convocação do Mano (que é pra ser esquecida mesmo). Esqueçam também a estreia do Fla na Libertadores, a possível renúncia de Ricardo Teixeira e a arbitragem do clássico de domingo.

Todos só querem saber dele.

Jeremy Lin.


A imagem acima é de ontem. Faltando 0.5 segundo para o fim, Lin fez a cesta de três que deu a vitória ao New York Knicks sobre os Raptors, em Toronto. Nada demais, por um lado - o time canadense é um dos piores da liga. Mas, por outro, foi a cesta que levou os Knicks à sexta vitória seguida. Nas últimas cinco, Lin foi o armador titular. Quebrou recordes sem tanta significância - comparar suas cinco primeiras partidas como titular às cinco primeiras de nomes como Jordan e LeBron chega a ser piada, dada a experiência deles à época, recém-saídos da universidade e do colegial, com a rodagem que Lin já possuía: 39 jogos só na NBA antes dessa titularidade. O que em nada diminuiu os méritos do mais novo ídolo de NY - nessas cinco vitórias, cinco saídas como titular, Lin teve médias de 27,2 pontos, 8,8 assistências, quarenta minutos em quadra e ainda cinquenta por cento de aproveitamento nos arremessos. Como dizem os ianques, Lin is for real.

E é descendente de asiáticos, apesar de ter nascido em Palo Alto, na Califórnia. Tão americano quanto LeBron.

A "Linsanity" que a imprensa americana vende não é fabricada. Surgiu espontaneamente, nas arquibancadas do Madison Square Garden, templo do basquete. Da desesperança de uma das torcidas mais apaixonadas da NBA - a mais exigente, certamente - surgiu esse anjo salvador, de pele amarela. No dia seis de fevereiro, data do primeiro jogo de Lin como titular, os Knicks amargavam um retrospecto de oito derrotas nos onze jogos anteriores. Estavam longe dos playoffs da Conferência Leste e sem nenhuma perspectiva de recuperação, por conta das ausências dos astros Carmello Anthony e Amare Stoudamire, contundidos. Mais uma típica temporada frustrante na história recente do time de Nova York, em jejum de títulos desde 1973.

Aí, Mike D'Antoni, o técnico - o mesmo que por tantas temporadas fez os Suns de Nash e do próprio Stoudamire serem um dos times mais divertidos de se ver jogar - resolveu apostar no armador rápido, mas sem nenhum pedigree, que poderia acelerar o pace do time. Deu certo. E não foi apenas resultado das circunstâncias. Com Lin no time, os Knicks venceram os Jazz em casa (28 pontos e 8 assistências), o sofrível Washington Wizards fora (23 e 10), os Lakers no MSG (38 e 7, roubando os holofotes de Kobe Bryant), além do Minnesota fora (20 e 8 diante de Ricky Rubio, outro queridinho do momento na NBA).

Mas, claro, nada disso é tão relevante quanto o fato de Jeremy Lin ser asiático. Pele amarela. Gente do outro lado do planeta que, supostamente, não sabe jogar basquete.

Yao Ming? Um fracasso, fenômeno que nunca atingiu seu potencial devido às inúmeras e graves contusões que o fizeram abandonar as quadras precocemente.

Mais alguém? Alguém?

(Não me venham com papo de Wang Zhizhi).

Pra deixar tudo um pouco mais improvável, Lin se formou em Harvard, a universidade acostumada a formar presidentes americanos, não jogadores da NBA.

Lin tem um diploma de economia em Harvard
.

Tudo isso somado faz o New York Daily News de hoje dar manchete sobre Lin ter abandonado o sofá da sala do irmão, onde vinha dormindo desde que chegou aos Knicks, por um apartamento nos subúrbios de Nova Iorque. Esse Jeremy Lin é o mesmo que passou na temporada passada pelo Golden State Warriors sem impressionar ninguém. O mesmo filho de tailandeses que amargou tempo no fim do banco de reservas dos Knicks no primeiro mês com o time, quando esteve em quadra por apenas 22 minutos.

Daria um filme.

Mas tem gente que acha que não. Que tudo se resuma à raça.

Ontem, Floyd Mayweather, ídolo do boxe, usou o Twitter para mandar a seguinte:

"Jeremy Lin é um bom jogador, mas toda essa promoção exagerada é porque ele é asiático. Jogadores negros fazem o que ele faz toda noite e não recebem os mesmos elogios".

Depois da repercussão de suas palavras, foi além, novamente via Twitter:

"Tudo bem que a ESPN dê sua opinião, mas quando eu digo algo todos questionam Floyd Mayweather. Eu falo em nome de outros jogadores da NBA. Eles são programados para serem politicamente corretos e serão penalizados se derem suas opiniões. Outros países dão suporte e torcem por seus atletas e está tudo ok. Mas assim que eu dou suporte a um atleta negro americano, eu sou criticado."

Hmmmm.

Mayweather, supremo boxeador, com 42 vitórias e nunca derrotado, é o mesmo que, em 2010, quando da luta contra Manny Pacquiao, botou um vídeo na web em que mandava o filipino "fazer alguns enroladinhos de sushi e cozinhar arroz", para depois emendar um "eu vou cozinhá-lo com alguns gatos e cachorros."

Donde se conclui que:

1) Sim, Mayweather é racista. Como muitos que sofrem com o racismo ao longo da vida.

2) Não, Mayweather não entende muito de basquete. Lin é tudo, menos produto da mídia - o produto da mídia, sim, é resultado de seu jogo recente.

3) Muita gente transforma o Twitter (e até o Facebook) em ferramentas para disseminar algumas das opiniões mais babacas que tenho ouvido.

Jeremy Lin, 23 anos, californiano de pais tailandeses, poderia se chamar John Wayne, ser loiro de olhos azúis e, ainda assim, seria notícia pelo fato de ter estudado em Harvard, ter se formado em economia e chegado à NBA sem despertar a atenção de olheiros que ganham muito bem para descobrir talentos como ele.

* * *

O próximo jogo de Lin é hoje, às 22h30, no MSG, contra os Kings.

Mesmo com o Fla jogando no mesmo horário, darei um jeito de ver o anúncio dos titulares dos Knicks e a festa da torcida para o wonderboy Lin.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

O Furo, A Barriga, A Tonta E O Burro.

Eu não exatamente aprecio a figura do Vanderlei Luxemburgo, faço logo questão de dizer. Corria o ano de 1998 e, pouco antes de a equipe do Sportv viajar para a França, participei de uma reunião com meu chefe de redação, o co-editor-chefe do jornal que também fecharia durante a Copa e ele, Vanderlei. Participei em termos - depois de apenas alguns minutos na sala, o técnico, então já bicampeão brasileiro, tinha contado tanta vantagem que comecei a ter náuseas. O fim da picada, quer dizer, da reunião, foi quando contou que o relógio que ostentava no pulso custara mais de 60 mil dinheiros da época. Pedi licença para ir ao banheiro e nunca mais voltei.

Depois daquele dia, Luxemburgo ainda conquistaria mais três campeonatos brasileiros, seria treinador da seleção e do Real Madrid e colecionaria escândalos, acusações e desafetos.

Seria demitido onze vezes.

A décima-segunda, dizem, seria ontem. Mas a vitória sobre o Potosí, que levou o Fla à fase de grupos da Libertadores, deixou sua situação em suspenso. Coisas do futebol, como disse o próprio na coletiva após o jogo (diga-se, uma das mais sagazes que vi em dezoito anos de carreira).

Não acho que Luxa tenha feito um bom trabalho nesse um ano e quatro meses à frente do Fla. O time não tem padrão, joga com muitos volantes, não se acerta na defesa e carece de uma movimentação fundamental hoje no futebol. É incrível que um treinador como ele não consiga fazer os jogadores entenderem e obedecerem conceitos básicos como aproximação, ultrapassagem, cobertura, marcação ao homem e não à bola...

Como também é incrível que, ainda hoje, um treinador de futebol se dirija a seus comandados, em treinos e jogos, como "filho-da-puta". Quem já prestou atenção ao trabalho de beira de campo do Vanderlei sabe que xingamentos e palavrões são as vírgulas entre as orientações aos jogadores.

Não deve ser fácil trabalhar com um cara assim. Alguém que, no auge de uma queda de braço com a estrela do time, decide perder horas na frente de um computador procurando imagens de uma suposta transgressão às suas regras. Assim como foi com Romário, Luxa mostrou, com Ronaldinho, que não é afeito a estrelas com personalidades maiores que a dele.

Podemos somar a isso tudo o fato do técnico ter perdido parte da antiga motivação; ter parado no tempo ao não apresentar nada novo desde 2003, há quase uma década, portanto; e, principal, ter envelhecido - prestes a completar sessenta anos, eu não sei se esse Luxa de hoje é mais sábio ou mais intolerante.


Fato é que, clima, não há. Fica claro que o grupo não o quer mais. Mas também é fato que há uma multa de quatro milhões no caso de demissão. E a atual mandatária do Flamengo, como todos sabem, não é muito boa na arte de tomar decisões. Patrícia é a principal responsável pela mágoa de Zico com o clube - sua atuação, no episódio da saída do Galinho, foi lamentável. Assim como é lamentável o clube ter praticamente institucionalizado a política do beiço - devendo a meio mundo, não é de se admirar que o clube não tenha hoje patrocínio master na camisa. Quem quer associar sua marca a tão grande sinônimo de desmando, incompetência e desonestidade? E as ações na justiça estão apenas começando a pipocar, com Alex Silva e Deivid.

Estão errados os jogadores em cobrar desta forma? Não.

Assim como não é culpa do técnico o atual estado das coisas do time. No fim das contas, Luxemburgo cumpriu o que prometeu e planejou - levou o Fla à Libertadores.

A presidente, no entanto, não cumpre praticamente nada que promete.

Nenhuma surpresa. Políticos sempre serão assim.


* * *

Também corria o ano de 1998 quando, por merecimento, tomei uma imensa chupada do mesmo chefe de redação do início deste post - diga-se, o melhor com quem trabelhei na vida, José Olívio Petit. Bem antes da tal reunião com Luxa, ainda no início do ano, o Fluminense procurava um técnico para assumir o comando do time. Era uma segunda-feira. Uma fonte graúda do clube me passara a informação, logo cedo, de que haviam não só chegado a um nome de consenso nas Laranjeiras, como acertado tudo com ele. Era Edinho, ídolo tricolor. Mas nada do anúncio oficial.

Vinte e cinco anos de idade, editor-chefe do telejornal da hora do almoço, decidi bancar minha fonte e dei a notícia. Ninguém tinha. O Globo Esporte não havia dado, a Manchete Esportiva também não. Furo nosso. Não, meu.

Vieram a tarde, a noite e nada de Edinho ser anunciado como o novo treinador do clube. No dia seguinte, claro, tive que dar explicações sobre as circunstâncias de minha "barriga".

Algumas horas depois, na tarde de terça, Edinho foi apresentado oficialmente.

Foi inevitável lembrar disso ontem, quando o globoesporte.com noticiou a demissão do Luxa, o acerto com Joel e até uma reunião de dirigente com jogadores para comunicar a saída do treinador. Quatro jornalistas assinaram a matéria. Não conheço todos, mas posso garantir que os que conheço são profissionais sérios e imagino que os outros também.

Mas furo é furo. E barriga é barriga.

Só não dá furo ou barriga quem não corre incessantemente atrás da notícia em primeira mão, essa é a moral das duas histórias.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

2012 Pode Ser Mesmo O Fim.


Afinal de contas, ao que parece, o fim da linha, o fundo do poço, o fim da picada - estão todos ali, no virar da esquina. Senão, vejamos.

Nesses vinte e poucos primeiros dias de 2012, vimos governantes do Rio e de Minas, principalmente, terem a cara de pau de, novamente, botar a culpa das enchentes e deslizamentos e mortes no clima. Um ano se passou desde a tragédia de 2011 e nada, absolutamente nada foi feito. Ainda assim, Cabral deve se reeleger com folgas quando chegar a hora; antes dele, o prefeito bufão da Maravilhosa fará o mesmo. Em São Paulo, ainda não me decidi sobre o que foi/é pior - a ação do Estado na cracolândia ou a desocupação do Pinheirinho, onde quase nove mil pessoas foram postas à força para fora de suas casas pela PM para que o Estado, sempre ele, garanta o direito de posse do terreno a ninguém menos que Naji Nahas, aquele criminoso que pegava dinheiro emprestado com bancos para fazer negócio com ele mesmo na Bolsa, através de seus laranjas. E, vejam só, o desgraçado foi absolvido pela Justiça de todos os crimes de que foi acusado - lavagem de dinheiro, corrupção, evasão de divisas, sonegação fiscal e formação de quadrilha. Pra completar, ainda tivemos o primeiro caso de estupro em rede nacional na TV brasileira - com Pedro Bial fazendo o papel de cereja do bolo ao afirmar, diante da cena editada no melhor estilo-melhores-momentos, que "o amor é lindo". E nada acontece diante disso tudo.

Mas o que todo esse lixo tem a ver com o Tudo Bola?

Tudo, infelizmente.

O ano que se passou não foi exatamente animador. Números não mentem - em 2011, escrevi somente 10 posts. Em 2010, foram 52, e em 2009, 104. Considerando que no ano passado eu praticamente não trabalhei em televisão, posso afirmar que foi quando tive mais tempo livre para escrever sobre minha grande paixão, o esporte. Paixão, profissão, comida e arte - porque o esporte pode ser isso tudo e muito mais. Porém, não foi.

Relembremos algumas, recentes:

- depois de semanas de excitação, expectativa e até uma certa debilidade nacionalista em relação ao assunto, o Santos foi ao Japão para, no fim, na final, ser goleado e humilhado pelo Barcelona. Pior que o placar, foi a forma da derrota - abdicando do direito de jogar para passar a maior parte dos noventa minutos observando o jogo do outro, de pé em pé, toque em toque. E pior que tudo foram ainda a postura e as declarações do "professor" Muricy após a partida. Não foi apenas a torcida do Santos que terminou o ano desiludida - todos que acreditamos na arte do futebol encerramos a temporada assim, descrentes de que dias melhores virão por aqui.

- após meses de um campeonato brasileiro alardeado como "o mais emocionante dos pontos corridos", tivemos um Corinthians campeão sem brilho, cheio de suspeitas fundamentadas (Itaquerão, Andrés na CBF, arbitragens estranhas) e com uma escalação que, cá entre nós, ficará na cabeça apenas dos corintianos mesmo. O Vasco, história mais bela da competição, ficou pelo caminho, como se previa para quem decidiu esgoelar o time (que já é velho) na reta final da temporada. Fla e Flu, então, sequer chegaram realmente a brigar pelo título nas rodadas finais - o Fla do time sem esquema e sem pênaltis a seu favor e o Flu do artilheiro boêmio, do meia capenga e do presidente que manda menos que o mecenas.

- Passado mais de ano e meio desde a pífia Copa de 2010, ainda não temos uma seleção brasileira. Na verdade, nem um esboço dela parecemos ter. Aquele Mano da primeira coletiva, que deixou entusiasmo e esperança no ar, sucumbiu à pressão por resultados, como se apenas eles fossem capazes de manter um técnico de seleção no cargo. E o resultado foi o pior possível - não tivemos nem o prazer do bom futebol, nem os tais bons resultados de uma seleção que começa a ficar conhecida por não vencer as demais grandes. Some a isso o papelão do Santos e a declaração de Pep Guardiola lembrando como jogávamos antigamente e chegamos ao panorama sombrio de 2011.

- Pra começar 2012, que tal o Fluminense aliciar Rodrigo Caetano e Thiago Neves; Adriano continuar quase tão gordo quanto Ronaldo; Kléber ainda ser a esperança de alguém e o Flamengo investir dez milhões de euros em Vágner Love, depois de vexame após vexame nessas primeiras semanas na terra de ninguém chamada Gávea?

E aí, qual minha motivação pra escrever?

Será que finalmente cheguei à conclusão de que nosso futebol, falando assim, de maneira ampla, da mesma forma que nossa televisão, nossos governantes e nossa política, em geral, são todos uma merda? Um bando de gente sem capacidade ou vontade que não sejam a capacidade e vontade de agir em benefício próprio?

É difícil dissociar o jogo de tudo que o envolve. Mas vou continuar tentando.

* * *

Hoje tem Flamengo abrindo a temporada em Potosí. No banco, um técnico que, dizem, amanhã já não o será. Em campo, um camisa dez que, dizem, está na melhor forma física desde que chegou ao clube (além de quatro, eu disse quatro volantes). Um ou outro precisa mostrar hoje que é o cara certo pro clube.

* * *

Nas próximas semanas, de (ainda) pouco futebol e (muita) apatia pelo cenário que o cerca, sobram o Superbowl repleto de histórias do próximo dia 5 (!) e a temporada da NBA, onde o Chicago Bulls fará história nesse ano. Mas isso fica pra já, já.

* * *

Love ou Thiago Neves? E aí, rubro-negros?

domingo, 11 de setembro de 2011

Amargos Dezesseis.

Estava no meio de um workshop da agência de notícias Reuters, num hotel em Copacabana, quando recebi a notícia de que um avião havia se chocado contra uma das torres do World Trade Center.

Todo mundo lembra onde estava e o qua fazia quando soube dos atentados do onze de setembro de 2001.

Dois anos antes, num 22 de julho, me encontrava na redação semi-vazia do Sportv quando assisti pela tv ao inesperado fracasso na tentativa de uma vaga para as Olimpíadas de Sydney, naquele pré-olímpico realizado em Porto Rico. Após duas vitórias e duas derrotas na primeira fase, fomos batidos por Canadá, Estados Unidos e Argentina nas quartas, deixando de participar pela primeira vez de uma edição dos jogos olímpicos.

Quatro anos mais tarde, naquele 28 de agosto de 2003, a redação estava ainda mais vazia e eu, perplexo, não encontrava palavras para escrever o texto da derrota diante do México que encerrava de forma pífia nossa participação no pré-olímpico, novamente em Porto Rico, dessa vez num vergonhoso sétimo lugar, depois de quatro derrotas seguidas na fase de quartas-de-final, para Argentina (2 pontos), Canadá (4), Porto Rico (2) e o tal México. Estávamos fora novamente.

No dia primeiro de setembro de 2007, estava à beira da quadra do ginásio da UNLV, em Las Vegas, quando perdemos para a Argentina por 91 a 80, da forma mais doída possível.

Onze meses depois, no 18 de julho de 2008, assisti da tribuna de imprensa do ginásio olímpico de Atenas ao fim do sonho do retorno, por conta da derrota por 78 a 65 para a Alemanha, que nos deixava de fora dos Jogos de Pequim.

Dá pra imaginar como foi minha noite ontem.

O choro ao fim foi um misto de raiva, alívio, orgulho e emoção de quem viu caras como Marcelo, Guilherme, Alex, Tiago, Huertas tentarem e tentarem e tentarem, sem sucesso. Nenê, Leandrinho, Ânderson, Valtinho, Murilo, Marquinhos, Rafael - foram tantos os nomes e as histórias ao longo desses dezesseis anos.

Dezesseis anos acompanhando carreiras iniciarem e acabarem sem a realização do sonho olímpico. Década e meia de piadinhas sem graça, provocações jocosas, crises, campeonatos inacabados, times e técnicos e presidentes que vieram e foram, além de títulos e mais títulos no vôlei, pra tornar tudo ainda um pouco pior de levantar depois de tantos anos andando pelas sombras.

Parou-se de ver basquete na tv aberta, a tv que todo mundo vê.

Ontem, doze caras, um genial técnico argentino e uma comissão técnica disposta a aprender com ele reergueram nosso basquetebol. Como nosso orgulho, ele agora está de pé, não sente mais vergonha de ser quem é e acredita que dias melhores virão.

Certeza que vem das convicções que emanam de um homem que foi capaz de se entregar como poucos fariam ao objetivo de disputar mais uma olimpíada, dessa vez, vejam só, comandando a seleção rival, vaiada e secada impiedosamente em Mar del Plata, como era de se esperar, assim como se esperava ver homenagens da mesma plateia a esse senhor chamado Rubén Magnano, logo ele, que como técnico nem medalha ganha e tem apenas dentro de si, na mente e na alma, o sabor e o significado de um ouro olímpico.

Serão 320 dias até Londres. Tempo suficiente para acreditar em mais do que apenas participar novamente da festa.


Nada mais apropriado ontem que a atuação de Marcelo Machado. Que dentre todos que tentaram ao longo dos últimos dezesseis anos foi quem mais esteve presente, mais tomou porrada de todos os lados e nunca fugiu da responsabilidade, da última bola, do próximo arremesso.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Sobre Maçãs E Bananas.

É da natureza humana.

Ana Hickman ou Alessandra Ambrósio? Android ou iOS4? Burguer King ou McDonald's?

Eu prefiro a Ana, apesar da beleza da Alessandra, talvez por conta da voz, e não das pernas, como seria de se supor. Não troco a liberdade do Android por nada, apesar de muitos acharem que qualquer coisa com a marca da maçã seja, na verdade, uma dádiva divina, através de Steve Jobs, para nós, mortais. E não há sanduba da cadeia do palhaço Ronald que supere um suculento Triple Stacker com a marca do reizinho. Mas essas, claro, são as minhas opiniões.

Assim é com o Barcelona. Para uns, o melhor time de todos os tempos. Para outros, apenas um entre os melhores.

Cabral ou Colombo? Kant ou Nietzsche? Van Gogh ou Rembrandt?

Comparações são muito mais antigas que o esporte, instrumento relativamente recente da raça humana. As olimpíadas modernas datam de pouco mais de cem anos, assim como o futebol e o basquete. A Copas do Mundo, o voleibol, o MMA - tudo isso é absurdamente novo em termos históricos e, mesmo assim, suscitam a mesma e eterna pergunta: quem é o melhor?

O esporte traz essa questão em sua essência. Busca-se a primazia, não a excelência. De pouco ou nada adianta estar entre os melhores, se nunca se chega a ser O melhor. Rubinho é o exemplo perfeito. A discussão sobre quem é o maior de todos os tempos é sempre mais interessante que aquela em que se repensa o papel de determinados atletas em seu tempo (a aqui não estou pensando em Rubinho como exemplo).

Ipanema ou Leblon? Lula ou FHC? Nikon ou Canon?

Barcelona, Messi e Scottie Pippen são os agentes motivadores desse post. Do Barça, todos sabem, todos viram, todos falam. O Marca já botou o argentino que é o astro do time acima de Pelé. Outros também o fizeram.

Pippen ateou fogueira de bem menos brasas ao dizer, essa semana, que Jordan pode ter sido um melhor cestinha, mas que LeBron James é o melhor jogador a já ter pisado numa quadra de basquete. Em todos os tempos. Pouco depois, via twitter, deu uma atenuada no comentário, afirmando que MJ ainda é o maior, mas que James pode vir a se tornar o mais completo. Já era tarde. Depois de vários nomes de peso terem partido em defesa de Jordan, Kareem Abdul-Jabbar, um dos maiores, botou em seu website uma "Carta Aberta a Scottie Pippen: Quão Cedo Eles Esquecem". Título genial. Tanto quanto a frase "seus comentários são equivocados por causa de sua perspectiva limitada." Eu, fã de Pip que sou, vou considerar que ele quis dar uma provocada no amigo MJ.

Coca-Cola ou Pepsi? Avid ou Final Cut? Feijoada ou churrasco?

Mas e o Barça? E Lionel?

Será mesmo que esse Barcelona, por melhor que seja, é tão superior a alguns esquadrões que não me saem da memória? Como o Milan que tinha Baresi, Maldini, Rijkaard, Gullit e Van Basten. Ou o Flamengo de Leandro, Júnior, Andrade, Adílio e Zico. Ou o Brasil de Carlos Alberto, Gérson, Rivelino, Tostão e Pelé?

Dani Alves, Xavi, Iniesta, Messi e Villa. Eu vi dois dos três que citei acima. Mas nem preciso ter visto a seleção de 70 mais do que já vi para saber que esse Barça pode, sim, estar na mesma discussão com os demais. Se é melhor ou não, aí é aquila velha questão...

Praia ou serra? Monica Mattos ou Cinthia Santos? Geisha Hi-Tech ou Kotobuki?

Com Messi, a questão fica ainda mais subjetiva que isso. Idade, títulos, gols, os parâmetros são variados. Os intangíveis também - idolatria, marketing, vídeo games. O mundo mudou, acelerou, massificou do Lionel à Mallu Magalhães. Tudo hoje é muito maior, grandioso e... efêmero. Dessa mesma discussão de agora, eu fugi em 2004, quando após duas temporadas soberbas, Ronaldinho era o sujeito da eterna pergunta. E Messi, estará a nos encantar assim daqui dois, três, quatro anos?

Pra mim, até Zidane ainda ocupa degrau mais alto. E enquanto Lionel não conquistar uma Copa, fica ali no mesmo time de Zico, Cruiff e Platini. Uma bela meia-cancha.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Isso É Tão Gay.

O reconhecimento da união homoafetiva.

As cretinices do deputado Bolsonaro.

O beijo gay na novela.

O respeito à diversidade sexual nunca teve momento tão propício para discussão no Brasil.

Enquanto por aqui o STF deu um passo histórico e avançou léguas em direção ao norte idealizado por todos quando pensamos em direitos humanos, lá nos Estados Unidos, onde apenas cinco estados reconhecem a união legal entre indivíduos do mesmo sexo - e a Califórnia não é um deles -, dois fatos recentes me fizeram pensar sobre como o esporte lida mal com a questão do homossexualismo - aqui e lá.

Há duas semanas, na série contra o Dallas Mavericks, Kobe Bryant, um dos mais famosos atletas do mundo, foi flagrado pelas câmeras de tv resmungando ofensas do banco contra um dos árbitros daquela partida - uma das quatro surras levadas pelos Lakers que fizeram o astro do time experimentar um nível de frustração considerável.

O pecado de Kobe foi ter usado a palavra fagot, que seria o nosso bicha ou viado. Acabou multado pela NBA em 100 mil dólares, mesmo tendo se retratado pela ofensa.

Domingo, na derrota dos Bulls para o Miami Heat, Joakim Noah, pivô do Chicago, estava sentado no banco de reservas quando ouviu de um torcedor do time da casa uma ofensa dirigida à sua mãe. Torcedor, diga-se, que estava sentado a uns três metros dele, que respondeu com um sonoro "foda-se, viado" e, assim como Kobe, foi pego pelas lentes da tv. Depois de muita celeuma - imaginem, na América, dois casos assim em duas semanas, que prato cheio -, com jornalistas defendendo multa ainda maior ou mesmo uma suspensão, Noah ficou 50 mil dólares menos rico. Filho do ídolo do tênis Yannick Noah, com raízes em Camarões, criado bem no meio do SoHo, em NY, Joakim é um dos atletas mais antenados e multi-culturais da liga, apesar da idade. Um jovem que teve berço de ouro, bem diferente do estereótipo vim-do-gueto-sou-o-alfa-aqui-porra. Antes mesmo da multa, pediu desculpas publicamente. Explicou que não quis ofender ninguém, que foi apenas um xingamento comum em resposta a outro bem mais grosseiro. Mas não foi menos crucificado por isso.


O que me leva ao caso Michael, central do time do Vôlei Futuro. Aquele que, na primeira partida das semifinais da Superliga, em Contagem, foi ofendido pela torcida do time da casa, o Cruzeiro. Michael é homossexual assumido.

No entendimento do STJD, através de decisão do relator do processo, Luiz Tavares, o caso foi enquadrado no artigo 243-G (praticar ato discriminatório, desdenhoso ou ultrajante, relacionado a preconceito em razão de origem étnica, raça, sexo, cor, idade, condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência), parágrafo 2º do Código Brasileiro de Justiça Desportiva que diz respeito a torcedores. O Cruzeiro acabou multado em 50 mil reais. A pena mínima era 100, a máxima, 100 mil. O Vôlei Futuro ficou pelas semifinais, o campeonato acabou e ninguém fez enorme questão de aprofundar a discussão sobre o fato, frágeis que são esses ovos.

Na época, meu primeiro pensamento foi: fodeu, agora todo clube de futebol será multado quando jogar em casa contra o Atlético Mineiro do Richarlyson - que não é homossexual assumido. Ou será que a regra, pro STJD, vale para o vôlei e não para o futebol? Ou será que só se trata de homofobia quando a ofensa é dirigida a um homossexual que tenha saído do armário? E se eu xingar meu irmão de viado na pelada, posso ser preso? Aliás, sair do armário é uma expressão politicamente correta ou estarei sendo homofóbico?

E usar uma pitada de ironia nesse texto, eu ainda posso?

Numa boa: é necessário, nesse amplo território que continua a se abrir na medida em que nos habituamos à diversidade do novo milênio, termos também muito cuidado com os excessos.

Porque eu não conheço um único torcedor de arquibancada, seja do esporte que for, que não xingue, grite e faça sua catarse quando torce por seu time. O que inclui chamar o homem do apito de filho da puta quando ele erra, o atacante adversário de viado quando ele simula pra ganhar tempo e cantar no ritmo dos tambores da torcida aquelas músicas com elogios impublicáveis às organizadas adversárias e à PM.

Na minha opinião, o esporte é espaço para isso e seu universo, até ontem, sempre soube lidar com essas permissões de maneira hábil. O que me faz pensar sobre como a mídia e o STJD fariam, hoje, com um árbitro como o saudoso Jorge Emiliano, o Margarida, que apitava na primeira divisão do futebol brasileiro na década de 80 e, entre outras polêmicas, agrediu uma jogadora em 1989. Ou como seria se todos os atletas gays decidissem, de uma hora para outra, sair do armário. Porque, numa boa, depois de quinze anos trabalhando com esporte, eu ainda me espanto como esse parece ser um universo exclusivamente hetero aos olhos da maioria. O que, na realidade, está longe de ser, como qualquer outro setor da sociedade.

Provocações de conteúdo sexual são inerentes ao universo masculino. Meninos se provocam, jovens, homens adultos também. É normal que levem isso para o esporte, sejam atletas ou torcedores. Acontece naturalmente. E, por isso, eu acho que o Cruzeiro jamais deveria ter sido multado se a torcida mineira tivesse ficado apenas no coro de "Bicha!", que pode nascer espontaneamente em qualquer estádio ou ginásio. E aí, pra mim, tanto faz se o coro é pro Michael, pro David Beckham, pro Bebeto ou pro Richarlyson.

Mas é mesmo muito complicado, hoje, o limite entre o aceitável e o condenável. Já é a coisa mais normal do mundo - ainda bem - que dois homossexuais se encontrem numa loja de conveniência e se cumprimentem efusivamente desta forma: "Bicha! Há quanto tempo!". A mocinha do caixa acha graça, o senhor na fila solta um sorriso de canto de boca. Mas, se na mesma loja, eu virar pra um amigo e mandar um "Deixa de ser viadinho", por qualquer motivo, certamente serei visto por alguém como um porco preconceituoso, quiçá um monstro homofóbico.

E eu não sou.

E o termo é usado por todos que conheço, das mais diferentes formas, e nem por isso as pessoas estarão querendo realmente ofender alguém quando o usam.

É aí que, me parece, está o grande problema. Na busca pelo politicamente correto, há dois caminhos: 1) surge o heterofóbico, aquele que enxerga homofobia onde não há e 2) abre-se caminho para que qualquer um acredite que ser politicamente incorreto é o que há, como escreve muito bem em seu blog no site do Estadão o sempre bom Marcelo Rubens Paiva. Eu concordo plenamente com o que ele defende - na distância entre o 8 e o 80, confunde-se liberdade de expressão com apologia ao uso de drogas, bom (ou mau) humor com falta de respeito. E, para cada caso, há um limite de tolerância diferente.

Então vamos combinar o seguinte: nem lá, nem cá; nem o exagero, nem o vale-tudo; nem heterofobia, nem muito menos a homofobia - fico com o respeito ao próximo, seja qual for sua crença, raça ou orientação sexual. Porque a vigilância exagerada, nesses casos, pode ser, sim, nociva. Ou até ridícula, como no caso envolvendo Kobe e Noah, em que a NBA passou a seguinte mensagem: sabemos que, num jogo, há palavrões o tempo todo e também xingamentos. Mas usar a palavra fagot está proibido, ok? Prefiram motherfucker, cocksucker, son of a bitch etc. E lembrem-se - cuidado com as câmeras.

E assim eu posso continuar sendo um fã de South Park sem me sentir mau por isso.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

É Tudo Bola - De Cristal

Há dois anos, por essa época, escrevi um post que tinha exatamente este título.

Estava prestes a começar o campeonato brasileiro de 2009 e eu previ que o Internacional levaria o título. Aquele time começava o campeonato com um ataque formado por Nilmar e Taison, um meio que tinha (e ainda tem, incrível!) Guiñazu e D'Alessandro. Acabou sendo vice.

O Flamengo, pra quem eu imaginei, na melhor das hipóteses, um quinto lugar, foi o improvável campeão. Começou aquele campeonato com Josiel, Obina e Maxi como opções de frente.

Imaginei que São Paulo e Cruzeiro terminariam na segunda e terceira posições - foram o terceiro e o quarto, no fim das contas.

Mas eu previ que o Avaí cairia e ele foi o sexto...

"Prever" um campeonato como o nosso é tarefa árdua. Nenhum torneio no mundo sofre tanto com o desencontro com o calendário europeu - que faz da nossa janela de transferências uma verdadeira guilhotina para os clubes daqui. Nem com as distâncias continentais, que os obrigam a viagens inimagináveis para outras culturas. E também não há outro lugar do planeta onde a parca capacidade de quem gere os clubes crie cenários de instabilidade como aqui, onde a falta de dinheiro em caixa só reforça as muitas dificuldades para se montar um time competitivo. Quem há de garantir que Neymar, Ganso, Lucas e Damião terminarão a temporada aqui? E ainda há a Copa América da Argentina e o Mundial Sub-20 da Colômbia, prontos para desfalcar ainda mais os pretendentes ao título durante várias rodadas.

Por isso, ao contrário de 2009, desisti da análise minuciosa de cada equipe. Me ative às possibilidades de desfalques e reforços ao longo do ano, ao relacionamento técnico-torcida e à capacidade (ou falta de) dos dirigentes para o planejamento da temporada. Além, é claro, de não esquecer o passado recente de cada clube, que sempre tanto tem a nos ensinar sobre o futuro. E ainda o fato de que muitos dos vinte participantes não jogarão em seus estádios por conta das obras para a Copa de 2014.

Então, sem mais delongas, aí vai o meu palpite para o Brasileirão 2009:

1º - Santos
2º - Cruzeiro
3º - Internacional
4º - Flamengo
5º - São Paulo
6º - Grêmio
7º - Corinthians
8º - Coritiba
9º - Atlético MG
10º - Fluminense
11º - Palmeiras
12º - Vasco
13º - Avaí
14º - Botafogo
15º - Ceará
16º - Atlético PR
17º - Bahia
18º - América MG
19º - Figueirense
20º - Atlético GO

Quem cai? Quem vai pra Libertadores? O boteco está aberto a todos.

quinta-feira, 12 de maio de 2011

Tristes Verdades.


"Uma cruz branca erguida sobre a favela do morro dos Macacos marca o local onde pessoas são queimadas vivas. Um cavalo faminto, costelas saltando, está amarrado ali perto por uma fina corda. Um campo de futebol próximo está pontilhado de pedaços de borracha derretida. Partidas não são jogadas aqui. A "gangue" Amigos dos Amigos, que comanda a favela, tem um ritual: seus membros envolvem seus inimigos com pneus, os cobrem com gasolina e ateiam fogo. Isso é chamado microondas. Fumaça negra sobe no ar. Numa escola morro abaixo, perto do famoso estádio onde a cerimônia de abertura das Olimpíadas de 2016 será realizada, os estudantes ouvem os gritos e cobrem os ouvidos. Esse é o Rio na vida real."

Essa é a abertura do texto assinado por Wright Thompson, repórter-sênior do website da gigante ESPN. São doze páginas e vinte fotos que, à esta hora, já foram lidos por milhões de pessoas em todo o mundo, e mereceram o lugar de primeira matéria do Jornal da Globo desta quarta, por conta da repercussão negativa causada pelas impressões do jornalista americano.

Eu, que li o texto ontem bem cedo, fiquei surpreso. Afinal de contas, nenhuma das fotos foi photoshopada pela turma da Worldwide Leader In Sports. São todas reais, com seus policiais armados de fuzis, caveirões e vielas escuras, moradores aterrorizados e até um helicóptero da polícia em chamas, no chão, abatido por traficantes. Eu lembro, você lembra.

"Ah, mas peraí, alto lá! O Morro dos Macacos já tá com UPP, o lance do helicóptero tem um tempão..."

Sei.

A UPP dos Macacos foi instalada em outubro do ano passado, tem sete meses. O helicóptero foi metralhado ali em outubro de 2009, um ano antes.

Não me parece tanto tempo assim.

* * *

"As favelas, consciência culpada do Rio, quase mil delas, olham o paraíso de cima, mas não compartilham dele."

Thompson segue o texto lembrando que, em 2010, houve 4.798 assassinatos na cidade, o que representa um quarto dos assassinatos em todos os Estados Unidos no mesmo período - enquanto os EUA possuem 300 milhões de habitantes, o Rio tem 6. Cita que a primeira favela surgiu em 1897 e que agora a cidade tem menos de três anos para consertar uma crise que cresce há um século.

"O relógio está correndo."

É claro que a primeira coisa que vem à cabeça de muitos é o despeito de um americano, dos americanos, da ESPN e de toda a América pelo fato de Chicago, com Barak e tudo, ter perdido para o Rio na escolha da sede dos jogos de 2016. Mas isso faria mais sentido em 2009, antes da decisão dos membros do COI. Dar porrada agora, faz pouco ou nenhum. Assim como não faz afirmar que Thompson pintou o artigo com cores fortes. Quando diz que o filho pequeno do presidente da associação de moradores dos Macados ainda tem pesadelos com o dia da invasão do morro pelo CV - na véspera da derrubada do helicóptero - ele não está criando um factóide. Nem quando lembra que a ordem da invasão partiu de líderes do Comando Vermelho de dentro de um presídio de segurança máxima. Muito menos quando descreve como são as incursões do BOPE nas favelas, onde moradores são passíveis de balas perdidas e abusos de autoridade da polícia. Os ônibus queimados às dezenas pela cidade - outra triste memória recente - também não surgiram da imaginação do americano.

É tudo verdade. Uma verdade a qual eu e você, talvez, estejamos acostumados, lamentavelmente.

* * *

Na minha concepção, Thompson constrói seu artigo a partir da invasão do morro dos Macacos porque viu ali um ponto de ruptura.

Até então, apenas quatro UPPs haviam sido instaladas na cidade - a pioneira, no Dona Marta, em novembro de 2008, e mais três, no ano seguinte, na Cidade de Deus, no Batam e no Chapéu Mangueira. Depois do absurdo daquele outubro de 2009, outras 13 seriam criadas em igual período de tempo, incluindo a dos Macacos.

O americano também não inventa depoimentos. Como o de uma professora, que meses depois de ser entrevistada, quando sabe da publicação do artigo, pede para não ser identificada. Ela conta sobre a escola onde leciona, onde crianças do jardim de infância ficam doentes por brincar na terra contaminada por fezes - não há rede de esgoto ali. É ela quem lembra do caso de um antigo presidende da associação de moradores, nascido e criado nos Macacos, mas que teve que deixar o morro quando traficantes queimaram sua casa e ordenaram sua saída, por não terem gostado, justamente, de uma entrevista.

* * *

"Um ano após o helicóptero ter sido derrubado, os moradores do morro dos Macacos souberam da notícia - eles seriam os próximos. Em 14 de outubro de 2010, quase 200 policiais subiram o morro e o encontraram livre de todos os traficantes que o dominavam, fugidos na véspera, quando do aviso da invasão. Nenhum tiro foi disparado."

Thompson revela então o medo corrente de todo o qualquer morador de comunidade pacificada: que a polícia vá embora. E o tom sensacionalista que muitos aqui enxergaram - e que não vi em momento algum das doze páginas de texto - dá lugar à esperança, dele e de quem mora nessas codições.

"Mas agora, pelo menos, há esperança. Os dois Rios estão colidindo e, em alguns lugares, um novo Rio se levanta."

Mas ele não se deixa levar pela inocência. Lembra que a professora continua com medo. Que os traficantes não estão mortos. Que a polícia esperava encontrar 50 armas pesadas no morro e nenhuma delas foi apreendida. Que o antido dono do morro está hoje na Rocinha.

Faltou lembrar que a cidade tem 13 favelas pacificadas e outras mil sob domínio do tráfico ou das milícias.

"O sol está baixo e quente. A professora está de pé, do lado de fora da escola. Agora há policiais sorridentes em sua favela e o campo de futebol voltou a ser usado para partidas, em vez de matanças. Ela olha a cruz branca, no alto do morro. Olimpíadas vêm e vão. Governos se cansam."

E nós, macunaímas que insistimos em ser, continuamos achando que a opinião de quem enxerga de fora está sempre errada.

Não está.

Errados estamos nós.

E, como Mr. Thompson diz, o relógio está correndo.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Ouro De Tolo.

Flamengo. Palmeiras. Internacional. Grêmio. Cruzeiro. Fluminense. Todos derrotados, em maior ou menor grau, de forma vergonhosa nesta semana.

Não vou falar do Coritiba, que venceu, e de quem eu ainda não assisti a um único jogo neste ano. Mas posso falar sobre os demais.

Quem é o Flamengo 2011? O time campeão carioca invicto? Ou uma equipe que, na Taça Guanabara, precisou dos pênaltis para passar pelo Botafogo nas semifinais; na Taça Rio, igualmente foi incapaz de superar Fluminense ou Vasco no tempo normal, merecendo aplausos apenas pela frieza na hora dos penais? E que, agora, precisa vencer o Ceará, fora de casa, por dois gols de diferença, para seguir na Copa do Brasil.

Quem é o Cruzeiro, o alardeado super-time celeste, que vinha encantando a todos nesse início de temporada? É o time eliminado em casa pelo Once Caldas? Ou o que neste ano já goleou por 8x1 e 7x0 adversários do porte de América de Teófilo Otoni e Democrata de Governador Valadares (com sotaque mineiro, por favor)? Ah, mas teve a melhor campanha da Libertadores. Ok, ok... num grupo com Deportes Tolima, Guaraní do Paraguai e um Estudiantes que igualmente já ficou pelo caminho nas oitavas...

A dupla Grenal teve, como adversários na primeira fase, potências como Júnior Barranquilla, Oriente Petrolero, León de Huánuco, Jaguares, Emelec e Jorge Wilstermann. Uau. E, nem assim, o Grêmio, que enfrentou os três primeiros, foi primeiro em seu grupo. No gauchão, goleadas sobre Canoas, Ypiranga e Inter de Santa Maria só reforçaram a falsa impressão de que estava tudo bem com os grandes do sul. Pois é, não estava.

E o que dizer de Palmeiras e Fluminense? Ambos sequer chegaram às finais dos respectivos estaduais. O Fluminense, que a duras penas se classificou na Libertadores, caiu diante de um oponente fraquíssimo - depois de fazer a vantagem de 3x1 em casa, não menos. E o Palmeiras... bem, o Palmeiras acordou para a realidade com um verdadeiro tombo do beliche, e do andar de cima - um 6x0 que ficará marcado de diferentes formas na história dessa equipe e do próprio clube.

Afinal de contas, o que se passa? Por que tanto alarde em torno da tal quarta-feira negra ou das derrotas de Fla e Palmeiras ontem? Alguém realmente se surpreende?

Os estaduais, além de um convite ao prejuízo, são fraquíssimos, se tornando também uma certeza de prejuízo técnico. Os clubes ocupam seus quatro, cinco primeiros meses do ano medindo forças contra equipes semi-profissionais - é o que são - formadas na última hora, com data de validade marcada e que não representam, de forma alguma, parâmetro algum para nada. Dezenas e dezenas de jogos com estádios vazios e sem real importância até que se chegue ao Grenal decisivo no sul, ao Cruzeiro x Atlético do título em Minas, ao Flamengo e qualquer um no Rio e o resto você já sabe, pois não há nada mais previsível que os estaduais.

Eles são como as novelas da grade da Tv Globo. Uma tradicão, um "charme", como querem alguns, em que já sabemos início, meio e fim da história, com direito a poucas surpresas e uma qualidade artística com a qual nos acostumamos apenas - mas que é baixa. Nem um nem outro é, realmente, bom. Ambos iludem quem os acompanha.

E eis que agora, após essa semana de revelações, teremos mais sete meses de futebol em que apenas o Santos segue na Libertadores e só restarão quatro clubes na Copa do Brasil a partir da semana que vem. A todos os outros, restam apenas 38 partidas pelo Campeonato Brasileiro.

E quem se achava forte para este, agora, se repensa. E quem se achava fraco, não se pensa tão mais assim.

* * *

E já que falei sobre acordar para a realidade, Ronaldinho Gaúcho, que não conseguiu se destacar num estadual com Boavista, América, Cabofriense e afins, foi vaiado durante todo o segundo tempo de ontem no Engenhão, a cada vez que tocava na bola.

É incrível como a gente nunca consegue acompanhar a imaginação do futebol. Nem a dos craques que tomam gosto pela vida fácil.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

"Why can't I be MVP?"

Dezenas de repórteres que o cercavam, naquela tarde gelada de media day em Chicago, antes do início da temporada, se entreolharam. Nenhum chegou a rir - afinal, estavam diante de um dos jogadores mais afáveis e gentis de toda a liga - mas, internamente, todos se perguntaram - "como assim 'por que eu não posso ser o MVP?'"

Quando soube, achei graça. Eu, torcedor fanático dos Bulls desde o tempo em que Michael Jordan perdia ano após ano para Celtics ou Pistons. Que torci como louco, no draft de 2008, para que meu time escolhesse aquele armador veloz como a luz, que havia perdido a decisão do título nacional universitário meses antes. Eu, que havia assistido a cada um dos 171 jogos de sua carreira até aquela tarde, achei a pergunta desmedida.

"Mas o que deu na cabeça do moleque pra falar uma coisa dessas?"

Só o chamo assim. Até minha mulher, hoje: "Como foi o moleque ontem?" Que fique claro - não há nada de moleque Neymar nele. Pensando bem, talvez não haja mais nada de moleque nele, nada que faça lembrar o garoto de 20 anos que realizou o sonho de vestir a camisa do time de infância, da cidade onde nasceu e cresceu. Todo jogador, quando é apresentado à torcida antes de uma partida, tem seu nome, número, posição e universidade onde jogou anunciados pelo locutor do ginásio. O moleque não. Pediu, desde a primeira vez, para que fosse diferente com ele. A universidade de Memphis não é lembrada.

"FROM CHICAGO... AT GUARD... NUMBER ONE... DERRIIIIICK ROOOOOSE!"


Voltando à pergunta que dá título ao post, voltando no tempo, recupero frases, mensagens trocadas com amigos e colunas dos chamados experts sobre a atual temporada, que se aproxima dos playoffs. Mesmo minha modesta previsão parecia exagerada - chegar à final do Leste e, quem sabe, com sorte, à final. Só que, antes da bola subir, ninguém em sã consciência botava os Bulls acima de Celtics, Heat ou Magic. E todos viam a tal pergunta como um devaneio de um garoto que começava a descobrir estar acima da média em sua profissão.

Hoje os Bulls asseguraram a primeira colocação do Leste, com 59 vitórias e 20 derrotas, ao vencerem o Cleveland. Não podem mais ser alcançados por ninguém. E ainda têm chance de terminar a temporada com a melhor campanha de toda a liga - estão só uma derrota atrás dos Spurs. Ao fim do jogo contra os Cavs, ninguém comemorou um centímetro a mais do que noutro jogo qualquer.


"Ele é o jogador mais consistente do nosso time. Defendendo, jogando machucado, jogando sério sempre. Esse ano, ele tem meu voto para MVP."

O moleque não é o personagem da frase. É o autor. Fala sobre o companheiro Luol Deng, o mais bem pago do time até a chegada de Boozer, há sete temporadas defendendo os Bulls. Um elenco heterogêneo, entretando harmonioso. E, acima de tudo, solidário. Seja num passe extra, numa ajuda na defesa ou numa entrevista, é evidente que o clima entre os jogadores lembra a camaradagem de uma equipe de colégio, não de profissionais com salários milionários e que, via de regra, pensam primeiro em si quase sempre. Completa a receita um técnico estreante - mas de longa estrada como assistente - e que teve seu mantra comprado sem receios por seus comandados: defesa. Os Bulls têm a melhor da NBA, ocupando a segunda posição em pontos cedidos e rebotes, além de terem a melhor campanha em casa (35-5) e a melhor média de diferença de pontos sobre os adversários (7,3). Números que têm tanta relação com os talentos individuais do elenco quanto com o suor deixado em quadra, sob o incentivo dos gritos roucos do técnico Tom Thibodeau.


"Não é por coincidência que os Bulls têm a melhor campanha do Leste. Eles estão jogando com mais aplicação que qualquer outro time e isso tem relação com sua campanha. E vem tanto de Tom (Thibodeau) quanto de Derrick Rose." - Doc Rivers, técnico dos Celtics.

Mas Thibodeau, lembrem-se, é um novato. Nunca foi head coach. Por mais que seja um nome reconhecido e respeitado na liga, sua demanda constante por esforço na defesa, somada à voz rouca como um Louis Armstrong, poderia facilmente cansar a beleza de atletas que, não raramente, se comportam como prima-donas. Poderia, se o melhor do time não fosse o primeiro a entregar-se de corpo e alma ao comando do treinador. Como na época de MJ, se o astro dá cem por cento nos treinos e nos jogos, sem jamais reclamar, quem há de agir de maneira diferente?


Ainda assim, os números individuais do moleque não são estratosféricos. Cerca de 25 pontos, oito assistências e quatro rebotes de média. Inferiores, por exemplo, aos de LeBron James, eleito MVP nas duas últimas temporadas. Mas números (no basquete, principalmente), não contam toda a história. Os Bulls começaram a temporada sem seu maior reforço, o ala Carlos Boozer. Pouco depois de sua estreia, perderam sua alma, o pivô Joaquim Noah. Recentemente, ambos, tiveram que lidar com torções de tornozelo, que os deixaram de fora por mais alguns jogos. Em todos eles, qual fosse a ausência, lá estava Derrick Rose, pronto para fazer o necessário para conquistar a vitória. Cinquenta e nove até aqui.

Há quem defenda que LeBron deveria levar o prêmio novamente. Há os que consideram Dwight Howard, do Magic, mais eficiente que Rose. Para alguns, o moleque seria apenas uma versão aprimorada e um pouco mais alta de Iverson. "Ele não chuta tão bem". "Não distribui tantas assistências". "Pontua demais para um armador".

Nesta temporada, o moleque foi o único entre os dez primeiros em pontos e assistências. Adicionou a seu repertório ofensivo um arremesso de três pontos respeitável - e que se tornará mais consistenta com o tempo. E foi "o" ataque do time quando preciso. Sempre com toda a equipe adversária concentrando sua defesa sobre ele - notoriamente, estes Bulls não têm muitas opções de ataque. Por isso mesmo Thibodeau deu sempre liberdade a Rose para arremessar, sabedor que é das capacidades e deficiências de seu grupo, recheado de bons defensores, como Gibson, Brewer, Bogans, Asik e um ou outro especialista, como Korver. O moleque precisou ser o ataque em muitas noites. E em todas elas, como armador do time, foi sempre quem tomou as decisões ou chamou a responsabilidade para decidir ele mesmo. Como mostra a campanha dos Bulls, acertou muitíssimo mais que errou.

Por fim, ninguém, hoje, no mundo, consegue ser mais veloz driblando uma bola de basquete do que o moleque. Não se trata apenas do talento nato, nem da aplicação absurda aos treinos. Derrick é uma aberração, dono de velocidade e impulsão nunca reunidas num mesmo atleta. E está só aprendendo a unir tudo isso a seu favor. Aprendendo rápido.

Então, se alguém me perguntar, eu direi: ninguém jogou mais nesta temporada que Derrick Rose. Aos vinte e dois anos, se tornará o mais jovem MVP de todos os tempos. E tem tudo para escrever, com esses Bulls, uma história de Cinderela poucas vezes vista na liga.

O moleque, claro, é o sapato de cristal.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Futebol, TV, Dinheiro e Uma Boa Briga

O próximo onze de março, uma sexta-feira, não terá futebol. Mas pode ser a data de uma mudança histórica, com consequências para todo e qualquer envolvido com a maior paixão popular do país, seja boleiro, técnico, jornalista, dirigente ou torcedor.

Às dez horas da manhã deste dia, se encerrará o prazo para que as emissoras interessadas enviem suas propostas para a aquisição dos direitos de transmissão dos Campeonatos Brasileiros de 2012, 13 e 14. A abertura dos envelopes - a licitação feita pelo Clube dos 13, publicada ontem, prevê ofertas fechadas - será feita em solenidade pública aberta à imprensa. Mas eu duvido muito que alguma rede de tv se interesse em mostrar ao vivo o resultado. Ou, talvez, apenas uma, como explicarei adiante.

Para situar quem não acompanha os bastidores - felizes daqueles que só sabem da bola - vale um rápido resumo. Há vinte e seis anos a TV Globo transmite o futebol brasileiro. Desde 1987, negocia os direitos de transmissão diretamente com o Clube dos Treze, que reúne as principais equipes do país. O contrato atual, que se encerra ao fim desta temporada, custou aos cofres da emissora (na verdade, aos seus anunciantes) a bagatela de 250 milhões de reais. Na negociação, feita em 2008, a TV Record chegou a acenar com uma proposta escandalosamente alta, em torno de 700 milhões. Mas tirou o time, na última hora, acusando o Clube dos 13 de dar à concorrente um direito de preferência que a impedia de vencer.

Só que, agora, tudo vai ser diferente. Como foi, aliás, quando da compra dos direitos de transmissão dos Jogos Olímpicos de Londres, adquiridos pela emissora do bispo por 60 milhões de dólares. O Cade - Conselho Administrativo de Defesa Econômica, que tem como função orientar, fiscalizar, prevenir e apurar abusos de poder econômico - está de olho em tudo. E na reunião marcada para a próxima terça com dirigentes do Clube dos 13, reafirmará, entre outras coisas, que não permitirá qualquer benefício a A, B ou C.

O Clube dos 13 estipulou a oferta mínima em 500 milhões de reais anuais, dando à TV Globo, como bônus, uma vantagem de 10% sobre as demais ofertas - uma espécie de "obrigado" pelos serviços prestados nas duas últimas décadas. O que, para mim, já parece um benefício.

OS CLUBES

Desde 87, ano de sua criação, o Clube dos 13 se viu diante de uma complicada equação matemática - como dividir o dinheiro dos direitos de transmissão entre clubes de tamanho, peso, torcida e prestígio tão diferentes. Como em qualquer divisão de bolo, todos querem a maior fatia. Hoje, Flamengo, Corinthians, São Paulo, Vasco e Palmeiras recebem o mesmo tanto. Que é superior ao destinado ao Santos. Que ganha mais que Fluminense, Botafogo, Inter, Cruzeiro, Grêmio e Atlético Mineiro. Os demais integrantes estão num patamar ainda inferior.

Por conta dessa divisão, a semana que se encerra foi pontuada por ameaças, bravatas e, principalmente, voltas atrás. Os quatro grandes do Rio chegaram a anunciar, oficialmente, a saída do Clube dos 13, afirmando a intenção de negociar, em grupo, seus direitos de imagem. Voltaram atrás no dia seguinte, quando negaram a desfiliação. O Corinthians, por sua vez, continua com a posição de desligamento. Chegou, inclusive, a conversar em separado com a TV Record. Mas também não saiu do Clube.

O motivo é simples - dinheiro. Imaginaram um cenário em que a negociação em separado os beneficiaria. Com o passar dos dias - e as consultas jurídicas e econômicas - viram que sair não seria tão fácil. Além de, provavelmente, não tão lucrativo. Num novo contrato, por exemplo, o Fluminense passaria dos 23 milhões atuais - mesma quantia recebida pelos grandes mineiros, gaúchos e pelo Botafogo - para 36 milhões. E isso, considerando-se apenas o dinheiro da tv aberta - pela primeira vez, plataformas como a tv fechada, internet e celular serão negociadas separadamente. Alguém em sã consciência consegue imaginar o Flu conseguindo arrancar 36 milhões anuais de Globo ou Record por seus jogos?

Fora isso, ainda há a questão do conceito de direito de imagem em si. Se um clube fecha com determinada emissora, esta só pode mostrar seus jogos se os seus adversários também tiverem fechado com ela. Do contrário, a transmissão se inviabiliza. Se o Flamengo fechasse com a Globo e o Corinthians com a Record, não teríamos os dois jogos entre os clubes na TV. O ponto final é dado pelo próprio Cade, que não autorizou a livre concorrência para cada clube e sim para o campeonato inteiro.

Some-se a isso tudo o curto tempo até a abertura dos envelopes, coisa de pouco mais de duas semanas, e fica a quase certeza de que toda a movimentação dessa semana não passou de alvoroço de dirigentes embevecidos com tantos cifrões.

AS TVS

Entre os que defendem a manutenção do futebol na TV Globo, os argumentos principais são a audiência e qualidade de transmissão superiores da emissora carioca.

A mesma que me faz, às quartas-feiras, sair do estádio já na quinta, para acordar morto de sono, poucas horas depois. Hoje, o futebol de meio de semana começa às 22h, horário só praticado no Brasil e totalmente incompatível com qualquer conceito moderno de marketing esportivo ou segurança pública.

A audiência, claro, é do futebol - e não da Globo. Para onde ele for, ela vai junto, pois ninguém vai parar de assistir aos jogos de seu time na TV porque o Galvão não os narra mais. O argumento restante - de que a audiência "não-futebol" da Globo será sempre maior, rendendo mais exposição aos anunciantes em seus programas e telejornais, também é questionável. As constantes reuniões de seus executivos preocupados com o crescimento da concorrente e com seus empregos servem de contra-argumento.

A questão do know-how chega a ser risível. Expertise e profissionais são adquiridos com muito mais facilidade que direitos de transmissão - e a Record teria um ano inteiro para isso.

O 11 DE MARÇO

Você já jogou poker? Domina a arte do blefe?

A mão começa em 500 milhões. Mas um dos jogadores tem um ás na manga que lhe dá 10% de vantagem sobre os demais. Que, na realidade, é apenas um - Band e Rede TV, apesar de convidadas, não entrarão nesta briga.

Quem tem o ás na manga depende do dinheiro dos anunciantes. Ganha muito, mas também gasta demais. Vive buscando maneiras de equilibrar seu orçamento e ainda lembra bem dos efeitos catastróficos da última grande crise. Só para mensurar o que significa pagar 500 milhões de reais por ano pelo futebol, basta dizer que o BBB 11, o de menor audiência mas de maior faturamento da série, rendeu 400 milhões de reais, o que foi considerado um resultado arrebatador.

O desafiante, que obrigatoriamente terá que oferecer 10% a mais para quebrar a mesa, também tem seu ás na manga. São milhões de fiéis. Talvez bilhões de reais em notas de dois, cinco, dez reais. Dízimo. Investigações do Ministério Público tentam provar que a origem do dinheiro não é legal e que TV e igreja, no fim das contas, são a mesma coisa.

E enquanto o MP não consegue seu objetivo, nada melhor para lavar uma inacreditável quantidade desse dinheiro de uma só vez que fazer uma oferta astronômica no próximo dia onze. Fala-se, hoje, em coisa de 700 milhões - mesma quantia da oferta retirada em 2008.

Não sei. Fosse eu, lavaria um pouco mais.

Porque essa é a chance que a concorrente espera há tempos. Um momento na história, que faz parte de um plano bem pensado e elaborado. Se Londres foi um soco no estômago, o Brasileirão seria um cruzado no queixo.

De levar à lona.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

R9

O ano era 1999, como na música daquele que um dia se chamou Prince. Confortavelmente apertado entre meus companheiros Sergio Costa e Andréa Bruxellas, seguia para Buenos Aires e, depois, Mar Del Plata, onde cobriria um Sul-Americano de Natação. Meu jornal já havia sido desmembrado entre os três, mas só a página de esportes interessava não somente a nós, mas a todos naquele avião. "RUPTURA DO TENDÃO PATELAR". Algo de que nunca ouvira falar. Tão aparentemente grave quanto as imagens do dia anterior, quando o joelho de Ronaldo havia "desmontado" no meio de uma arrancada. Entre infográficos - acho que esse termo ainda nem era usado na época - e opiniões de diferentes médicos, uma certeza: dificilmente ele voltaria a ser o mesmo, se voltasse a jogar futebol.

Três anos depois, em Seul, lá estava eu, no meio do bloco de carnaval que percorria os corredores do International Broadcast Center, curtindo com a cara de jornalistas argentinos, ingleses e, principalmente, alemães, enquanto cantava a plenos pulmões o penta conquistado com dois gols de Ronaldo na final.

Um dos baratos de se envelhecer, quando se é um jornalista esportivo, é começar a valorizar a chance de ter podido acompanhar, do início ao fim, carreiras como as de Ronaldo. Uma história bonita, repleta de tudo que um astro do rock, digo, futebol, pode querer. E que, por isso mesmo, termina com um quê de novela burlesca.

Ronaldo nos deu uma Copa, com oito gols em 2002. Nos tirou outra, com sua misteriosa convulsão antes da final em 98. Ou talvez duas, tendo sido o "Presidente" da turma do oba-oba e da balança em 2006.

E quem há de dizer que essa balança pesa contra ele, o maior artilheiro de todas as Copas e herói do penta?

Ronaldo foi três vezes eleito o melhor do mundo, numa época em que ser o melhor era estar acima de nomes como Zidane, Figo e Weah. Também por três vezes superou graves lesões nos joelhos, duas delas em joelhos diferentes, a tal ruptura patelar. E eu estava entre os que duvidaram de seu retorno ao campo em ambas, principalmente a segunda, há apenas três anos, quando o craque já tinha 31.

Ronaldo foi craque, sim. Da bola e do marketing. Se associou à gigante Nike como nenhum boleiro havia feito antes. Tornou sua imagem mundial. Tornou-se um ídolo mundial. O que só fez aumentar a repercussão de seus escândalos e desentendimentos, fosse com travestis, esposas ou até seu assessor. E tudo ísso apenas arranhou sua imagem.

Foi traidor não uma, mas duas vezes, no tortuoso caminho Barcelona-Internazionale-Real Madrid-Milan. Foi gênio no Barça, mas saiu. Ídolo na Inter, mas saiu - depois de quinze meses recebendo salários em dia enquanto se recuperava da lesão de 99. No Real, coexistou com galáticos mas não levantou as taças esperadas. No Milan, já era uma sombra de si. E ainda teve o Corinthians, onde foi decisivo para as conquistas de um Campeonato Paulista e uma Copa do Brasil. Mas saiu pressionado por uma chuva de moedas e críticas.

E assim sai do futebol. Quem há de dizer que sai tarde? (Cedo, certamente, ninguém).

Ronaldo foi até onde pôde. Chegou onde jamais sonhou.



Ponto final posto, resta discutir o verdadeiro lugar dele na história do futebol. Ronaldo entra, claro, diretamente no panteão dos maiores atacantes de todos os tempos. E aqui já me limito a eles, os atacantes, pois se abrir mais a lista, entrarão umas duas dúzias de craques na frente dele.

Tiro os títulos, os gols em Copas, os comerciais e a idolatria mundial. Fico apenas com a bola.

E aí, sou mais Romário. E, se fosse pro meu time, Marco Van Basten, em seus tempos de glórias e tornozelos inteiros.

Questão de gosto, pura e simples.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

The Twilight Zone

Nesta quarta, dois de fevereiro, milhões de rubro-negros - além de um bom bocado de torcedores de outras equipes - serão testemunhas de uma história com cara de episódio da série Além da Imaginação:

Ronaldinho Gaúcho, duas vezes eleito o melhor do mundo, pentacampeão mundial com a seleção brasileira, eleito o melhor jogador da década passada, estreia no Flamengo, no Engenhão, contra o Nova Iguaçu, pela quinta rodada do Campeonato Carioca.

Até ouço a inesquecível trilha de abertura enquanto releio o parágrafo acima.

Imponderável - não há Maraca - e questionável - o adversário de estreia - à parte, ninguém, absolutamente ninguém em sã consciência seria capaz de imaginar que, aos trinta anos de idade, Ronaldinho acabaria no Flamengo; não como Romário, que retornou ao Brasil, em 95, no auge, e sim como seu xará mais pesado e laureado, outro penta mundial que também preferiu pendurar as chuteiras por aqui.

Que Ronaldinho esperar? O genial, de 2004 e 2005? Ou o boêmio, de 2010 e... 2003. Já naquele ano, o técnico do Paris Saint Germain, Luis Fernández, meio-campo da seleção francesa durante uma década, criticava o brasileiro por conta de seu gosto exagerado pela vida noturna. Paris, Barcelona, Milão, 30 ou 23 anos, não importa - Ronaldinho não mudou com o tempo, não se deixou deslumbrar pelo sucesso. Ele sempre curtiu a fama da melhor forma possível. Quem se impressionou, agora, pelo oba-oba em torno de sua vinda para o Flamengo, pelas idas e vindas promovidas pelo irmão-empresário Assis, não deve se lembrar que, entre fevereiro e agosto de 2001 - oito meses, portanto - Ronaldinho ficou parado, impossibilitado de jogar, por conta da disputa judicial entre o Grêmio, time que ele abandonou, e o PSG.


Estes talvez também não lembrem que, em julho de 2008, há apenas dois anos e meio, era a torcida do Milan que vivia a expectativa que a nação rubro-negra vive agora. A mesma que toda a torcida brasileira viveu em 2006, no Mundial da Alemanha, quando Ronaldinho já não demonstrava interesse pelo futebol. Ou dois anos depois, nas Olimpíadas de Pequim, quando o Gaúcho, no meio de garotos, nenhuma diferença fez, selando de vez seu destino enquanto Dunga fosse o técnico da seleção. Acabou vendo a Copa de 2010 pela tv. Ou não. Ronaldinho sempre disse que não gosta de assistir a jogos de futebol (embora tenha estado nos últimos do Fla, sempre no camarote da presidente Patrícia Amorim).

Fadado ao fracasso, então?

Depende. Basicamente, de uma questão de vontade.


Ronaldinho conquistou tudo que um jogador profissional pode querer. Mas não conquistou tanto. Com a seleção, foi campeão do Mundo, das Copas América e das Confederações. Pelo Barcelona, foi eleito o melhor do mundo duaz vezes, campeão da Liga dos Campeões e espanhol. Por estas bandas, só o título gaúcho de 99.

Aos trinta anos, ainda poderia querer muito mais. A questão retorna: ele quer?

Porque o querer depende, basicamente, daquela vontade de ser o número um, estar sempre no topo. Como escrevi aqui em outro texto, trata-se daquela obsessão que une nomes como Jordan, Schumacher, Valentino e outros. Algo que, todos concordam, o Gaúcho perdeu pelo meio do caminho.

E se jogar no Barça um dia já não mais o motivou, se ser ídolo em Milão não fez sua cabeça, que oportunidade melhor para quem precisa de motivação do que jogar no clube de maior torcida do país? Ronaldinho não precisa ter nascido em Quintino, nem ser torcedor do Flamengo desde criancinha para saber o que significa defender suas cores, como o próprio disse, em sua apresentação.

E que chance melhor que estar num clube que se renova de esperança, após um 2010 pífio, quando todos ainda comemoravam o fim do jejum de 17 anos sem título brasileiro? Que situação melhor que estar sob o comando do treinador que o levou para a seleção brasileira? Tudo conspira a favor dele.

Basta querer. E é aí que a porca torce o rabo e eu tiro de campo minhas impressões como jornalista para explicar, através de meus quase trinta anos de arquibancada, aquilo que é mais importante Ronaldinho saber, a partir de amanhã:

Essa torcida não perdoa a falta de vontade.

Essa torcida ignora até a falta de talento se o sujeito deixar o sangue em campo. Perguntem a Willians, ou mesmo ao Toró, porque eles nunca foram vaiados (ou perguntem ao Juan, agora no São Paulo, como é cair em desgraça por conta da falta deste sangue).

Essa torcida elege ídolos eternos por conta da identificação com esse espírito, sejam eles vencedores, como Zico e Pet, ou nem tanto, como Romário (que quase nada conquistou pelo clube). Assim como não perdoa traidores, mesmo que, um dia, tenham se imbuído desse espírito (como Renato Gaúcho e Bebeto, por exemplo).

Eu, como profissional, me mantenho cético - assim como cético fui quando Adriano retornou, em 2009, e nós acabamos campeões brasileiros.

Eu, como torcedor, vou apoiar e incentivar qualquer um que vista o manto. E vaiar e cobrar e exigir daqueles que não entendem o que é defender o Flamengo.

* * *

Se o espírito de Ronaldinho, o mesmo espírito que perdeu o viço lá pelos vinte e cinco anos de idade, não se renovar, não se deixar contaminar por esse sentimento, então será o fim.

E, assim como outros que deixaram de encarar o futebol como paixão para tê-lo apenas como profissão, ele poderá angariar mais alguns milhões na MLS ao lado de ex-parceiros e adversários como Henry e Beckham. O que seria um capítulo final nada glorioso para quem, um dia, foi comparado a Pelé e Maradona.