sexta-feira, 22 de outubro de 2010

2K

Os fios brancos na barba não me deixam mentir - eu joguei muito futebol de botão.

Nascido em 73, infância entre a Tijuca e Botafogo, eu realmente não cheguei a ser bom na bolinha de gude ou na pipa, mas no botão... Torneios no colégio - no Anglo-Americano ou no Marista São José -, na faculdade - ok, na ECO preferíamos o totó e a sueca -, ou no trabalho, nada me escapava. Afinal de contas, meu background era forte.

Não sou do tipo de pessoa que tem ricas e coloridas memórias de infância. Nem sonho em me lembrar de nada que tenha acontecido antes dos meus cinco, seis anos, tirando um ou outro flash desbotado. Mas jamais esquecerei das pequenas luzes estroboscópicas adaptadas, das faixas e bandeiras de papel imitando as torcidas, dos cotonetes embebidos em álcool, em chamas, colados na lateral da mesa, e do papel picado atirado para o alto por um canhão do forte apache playmobil - era o Flamengo entrando em campo, para uma final de campeonato, no momento em que minha mãe entrava no quarto, horrorizada com todo aquele arsenal em torno da mesa de botão. Eu tinha dez anos e emulava a decisão de 83, entre Flamengo e Santos.


Joguei durante toda a infância, sistematicamente. Campeonatos carioca, paulista, gaúcho, brasileiro, italiano, espanhol, Copa dos Campeões, Libertadores, Mundial, Copa do Mundo - era sempre eu contra eu, enquanto narrava, comentava e reportava, tudo (inclusive o jogo em si) na maior imparcialidade possível. Não, o Flamengo não era sempre o campeão. Mas eu sim. Joguei tanto botão na vida que, a partir de um determinado momento, ficou sem graça jogar com os outros (e, para eles, contra mim). E, como se diz sobre andar de bicicleta, essa habilidade jamais me abandonou. Já adulto, soube que o terceiro campeonato organizado no Sportv foi feito de forma sorrateira, sem a presença deste que havia tirado a graça dos dois anteriores. E não, nunca fui de tirar sarro dos outros enquanto jogava. Só com meus irmãos. Meu sarro era dadinho no filó.

* * *

Todo esse preâmbulo tem razão de ser. Ontem eu corri da tv para casa, assim que pude, para instalar em minha máquina o PES 2011 - o Pro Evolution Soccer, melhor (para mim) game de futebol do mercado.


Não é tão lúdico quanto o futebol de botão, é verdade. Mas não adianta resistir ao tempo, senhor de todas as coisas. Hoje, quando sento no sofá com meus amigos para jogar, me divirto mais do que quando impulsionava com uma palheta um botão de acrílico ou galalite contra um dadinho, mirando o gol. Não há comparação. Os anos 2000 trouxeram um realismo e dinamismo aos games que jamais imaginei serem possíveis lá nos distantes anos 80, quando sonhava sobre como seriam as coisas no novo milênio.


Praticamente todos os times do planeta. Gráficos e movimentos de um realismo a cada ano mais assustador. Possibilidades infinitas, como ser um jogador, desde a base até chegar à seleção nacional, ou, quem sabe, o técnico do Flamengo, na disputa de uma Libertadores. E a melhor de todas - assumir o papel de manager, montar seu próprio time e disputar sucessivas temporadas, acompanhando o crescimento do clube e o desenvolvimento dos jogadores. Tudo com um olho nas finanças - gastar dinheiro demais em negociações e contratos pode levá-lo à falência - e outro naquele garoto de 19 anos que joga no AEK e pode ser seu próximo grande craque.

Não dá pra competir. Tem uns bons dois ou três anos que não empunho uma palheta


Às cinco da manhã, o time estava montado. O Rubro-Negro tem uniforme, claro, à imagem e semelhança. Sua casa é a Amsterdam Arena, rebatizada Ninho do Urubu, mas ele jogará o campeonato espanhol - começando pela segunda divisão. Vai num 4-2-3-1, muito parecido com o Real Madrid de Mourinho. Se nenhum problema físico atrapalhar, vai a campo hoje à noite, em sua estreia, com Mandanda, Rafael, Cristian Zapata, Onuoha e De Ceglie; Schweinsteiger e Hamsik; David Silva, eu e Cláudio Rodríguez; Lavezzi.

O "eu", claro, à perfeita imagem. Mas não semelhança. Porque no mundo real, meu esporte é mesmo o basquete. Sou ruim toda vida com a bola no pé.

Nada como os tempos modernos.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Quando Desesperança E Felicidade Se Misturam.

A cena, ontem, me fez mal.

No estacionamento do "CT" do Flamengo, Zico, com cara de nenhum amigo, se dirigia ao carro, após mais um dia de turbulência no Flamengo, quando foi interpelado pelo repórter Cícero Melo, da ESPN Brasil. Uma, duas, três perguntas. Nenhuma resposta. A porta do carro se fecha e Zico vai embora.

Nenhum questionamento quando à postura do Cícero. É dever do repórter, mesmo sabendo que, se não falou em coletiva, se não falou com ninguém, Zico provavelmente também não falaria com ele. Mas eu, no seu lugar, também tentaria. Só não poria no ar depois, por uma questão de elegância.

O que me fez questionar o estado atual (não mais) das coisas foi a postura do Zico. Aquele semblante. De um Zico que eu não reconheci nas imagens. Fiquei profundamente triste ao pensar que, depois de tudo que fez pelo clube, o Galinho agora pudesse estar numa situação em que, trabalhar para o clube, lhe causasse tanta angústia. Angúsia pela pressão, normal quando o Flamengo não vai bem, mas, principalmente, pelas acusações, tramóias, motins e pessoas escusas que rondavam seu trabalho nos últimos quatro meses.

Aí hoje eu chego no trabalho e dou de cara com a notícia de que Zico pediu o boné.

O primeiro sentimento, claro, foi de revolta e desesperança. Como pode alguém que se diz rubro-negro duvidar da idoneidade do Zico? Como pode, ainda hoje, a mesma corja que se instalou na Gávea na segunda metade da década de noventa ter tanto poder?

Quem é "capitão" Léo pra ser presidente do Conselho Fiscal do clube, depois de ter aprovado as contas de Edmundo Santos Silva em 99? Quem é Hélio Ferraz pra dizer que vai cobrar do "piloto" do futebol explicações pela má fase? Quem é essa gente, rubro-negramente falando, perto do Zico?

Por outro lado, agora, sinto alívio, uma quase felicidade pela saída do Galo. E me recordo do que senti quando, depois de 14 anos, pedi demissão do Sportv, por não concordar com os rumos do canal e com as decisões dos "capitães léos" de lá. Não é justo, numa relação de trabalho, que um lado se mate, se doe, se aborreça e se frustre enquanto o outro bate, explora, cobra e erra seguidamente.

Por isso, posso dizer que fico feliz com a saída do Zico do Flamengo. Feliz por ele.

O Flamengo atual não merece uma pessoa como Zico.

Merece, sim, sujeitos como o da foto. Ex-chefe de torcida, ex-dirigente da Ferj e, agora, ex-rubro-negro, como fica provado neste episódio.


Pra quem quiser entender o porquê das denúncias deste sujeito serem descabidas, sugiro a leitura da coluna de hoje do PVC.

E, por favor, que ninguém me venha com o argumento de que Zico errou ao abandonar o barco num momento de crise. Porque ninguém que se ache no direito de dizer isso jamais fez, pelo Flamengo, os sacrifícios que Arthur Antunes Coimbra fez.

Nem perto disso.